Vendas online continuam crescendo, apesar do fator limitante da logística no Brasil


Após mais de 20 anos de história, o e-commerce no Brasil encontra um novo desafio para manter sua velocidade de crescimento. Atualmente, a logística de entrega é a principal barreira para o crescimento das vendas online em nosso mercado.

A Gmattos, empresa especializada em negócios online, estima que, em 2019, as vendas por este canal para pessoas físicas no Brasil movimentarão quase R$ 130 bilhões, sendo 35% deste volume (R$ 45,5 bilhões) em bens de consumo. No histórico, as vendas do varejo online apresentam crescimento constante de 2 dígitos ano a ano, nos últimos 10 anos. Claro que, não incólume à realidade econômica do país, crescendo menos ano a ano, nos últimos 3 anos.

O volume de vendas online (bens de consumo) deve implicar a mais de 100 milhões de entregas, em 2019, o que será um recorde no histórico – mesmo considerando que o segmento “Food” (tipo iFood e similares) não estão contemplados nesta estatística, ou seja, as entregas totais seriam bem maiores, se este segmento fosse incluído. O patamar alcançado de entregas é interessante, dado que temos aproximadamente 20 milhões de consumidores online ativos, equivale dizer que, em média, este público realiza 5 compras de bens que exijam entrega por ano.

Com toda esta robustez em volumes, a logística no Brasil dá sinais de limitação e deterioração, passando a ser um gargalo para o crescimento do mercado.

Além das dificuldades em operar serviços de entrega em um país com dimensões continentais, a logística brasileira é impactada pela infraestrutura de transporte carente, acarretando custos elevados, de um regulatório fiscal inadequado e leis estaduais ou municipais polêmicas, como por exemplo, a Lei da Hora Certa em São Paulo, que obriga o agendamento de data e hora para entrega de mercadorias vendidas pelo e-commerce. A greve dos caminhoneiros, ocorrida em maio de 2018, colocou em evidência as limitações logísticas do país, impactando a economia de forma geral e causando particular transtorno ao e-commerce brasileiro. Entretanto, este evento pontual, apenas escancarou a situação crítica do serviço de logística.

Com poucos provedores especializados, o processo logístico para o e-commerce apresenta forte dependência dos Correios, que possui 37% de participação no volume de entregas, de acordo com estudo recente do Webshoppers. Os demais provedores privados, como JadLog, Total Express, entre outros, têm juntos 53%, segundo o mesmo estudo. Esta concentração é negativa, considerando a carência de provedores e o estado deteriorado dos serviços. Para tornar ainda mais dramática a situação, os custos de distribuição, tarifados pelos Correios foram majorados, dificultando a operação de pequenos comerciantes, já que, para eles, os Correios é o provedor único, pela cobertura do serviço e pelo preço.

Alguns fatores amenizam ou tornam menos crítico o cenário. Dois deles merecem menção: o primeiro é a forma de entrega “pick up in store”, bastante incentivada por lojas multicanal. A retirada na loja, introduzida há poucos anos por aqui, já representa 10% das entregas para os players que oferecem este tipo de serviço. Trata-se de um “ganha / ganha”, pois a loja elimina o fluxo da última fase da logística, diminuindo custo e transferindo algum benefício de preço para o consumidor, que, além disso, pode ter a agilidade desejada na entrega. A geração de fluxo de visita em seu ponto físico também é favorável para a loja.

Outro fator atenuante é o crescimento de novos segmentos no e-commerce como, por exemplo, materiais de construção e supermercados, que normalmente usam logística própria para entrega, embora circunscrevendo suas vendas online às regiões próximas aos seus pontos de venda. Segundo estudo da ABRAS, as vendas online representam 10% das vendas dos supermercados que oferecem este canal.

Estes dois fatores juntos contribuem para um quadro menos crítico na performance das entregas no Brasil, suavizando a curva de demanda pelas entregas online via provedores logísticos. Mesmo assim, é desconfortável a constatação de que a barreira física da logística limita a venda digital do e-commerce.

Este problema pode se transformar em oportunidade, pois temos aqui uma potencial condição para a formação de novos players no segmento de entregas, o que já pode ser observado com empresas como Loggi e Rappi, que nasceram com outros propósitos, mas usam sua malha de entregas para atender parte das demandas do e-commerce.

Outro elemento de transformação é a tendência de grandes operações varejistas absorverem a logística ou parte dela, verticalizando a operação de entrega. Além disso, é estratégico colocar maior poder de decisão sobre a última fase do ciclo de venda dentro da gestão da loja: a entrega final da mercadoria ao seu consumidor.

Não por acaso, e para uma realidade de infraestrutura menos caótica, a Amazon desenvolveu logística própria, hoje assumindo 26% de todas as suas entregas nos Estados Unidos permitindo, com isso, agregar novos serviços, como o recebimento da compra no mesmo dia e o Amazon Key, no qual o entregador tem acesso ao interior da residência do consumidor para deixar a mercadoria adquirida (tudo controlado virtualmente, é claro).

Já no Brasil, a gestão e ampliação da logística é um tema de urgência para as vendas digitais para recuperarmos o seu crescimento, aproveitando a ainda forte demanda de migração do consumo para o online.

por Gastão Mattos, sócio-fundador da Gmattos, empresa especializada em negócios online, com foco em pagamentos