O termo compliance vem do inglês “to comply” e significa “estar em conformidade”. Mas, o que isso quer dizer exatamente? Na prática, o compliance tem como objetivo proporcionar segurança e minimizar riscos de instituições e empresas. Essa prática garante o cumprimento dos atos, regimentos, normas e leis estabelecidas interna ou externamente nas organizações. A inclusão do compliance pode trazer impactos positivos e uma série de benefícios às companhias como, por exemplo, atrair profissionais que pretendem fazer investimentos em empresas sólidas sem o risco de se envolver em escândalos.
Para a analista de compliance da Tecnobank, Thais Takagi, as práticas são aplicáveis em todo o mundo. “Trata-se não apenas de imposições jurídicas de conformidade com normas internas e externas, mas também, de um aculturamento empresarial ético, válido para empresas de todos os portes e segmentos”, ressalta. Segundo ela, o compliance deve estar totalmente relacionado ao negócio central da organização. “Ao adotar práticas de engajamento, a instituição se fortalece, coibindo eventuais comportamentos inadequados, que podem manchar a reputação da empresa”.
Buscando entender mais sobre o assunto e ajudar quem tem interesse, alguns dos maiores especialistas do tema no Brasil indicaram 10 filmes e séries que mostram o compliance (ou a falta dele) na prática.
A Grande Aposta
Lançado em janeiro de 2016, o longa é uma adaptação do livro “The Big Short”, escrito por Michael Lewis, de Moneyball e Um Sonho Possível. Com um time que reúne astros como Ryan Gosling, Christian Bale, Brad Pitt e Steve Carell, o filme retrata uma história real de um grupo de investidores que “apostou” contra os bancos em 2008 e conseguiu ganhar muito dinheiro com o estouro da crise financeira. “Um dos pontos fortes do filme é que ele consegue explicar o tema, para quem não sabe o que foi esse período, de forma bem didática”, conta a diretora de Ética e Compliance e acadêmica da Academia Nacional de Seguros e Previdência (ASNP), Patricia Godoy Oliveira.
A Lavanderia
Baseado no livro “Secrency World”, A Lavanderia se propõe a retratar o escândalo dos Panama Papers, um vazamento de proporções gigantescas ocorrido em 2016, cujos dados sigilosos mostraram como um escritório de advocacia no Panamá dava respaldo legal para a criação de dezenas de milhares de empresas, sendo que muitas delas eram usadas para evasão fiscal e lavagem de dinheiro.
Dirigido pelo ganhador do Oscar, Steven Soderbergh (da trilogia “Onze Homens e um Segredo”, o espetacular “Contágio”, entre outros), o longa de 2019 se propõe a explicar de forma didática como o esquema fraudulento funcionou. Para isso, ele coloca os dois advogados (Gary Oldman e Antonio Banderas), cujo escritório está no centro do escândalo, para falar com o espectador, mostrando, com um sarcasmo genuíno, como funcionava o sistema formado por crédito suspeito, evasão de impostos, juros, contas offshore, sonegação e lavagem de dinheiro.
Tudo mastigadinho para que até o mais leigo dos espectadores entenda, o filme é embalado por roupas espalhafatosas e boas piadas. “Com excelente direção e grandes atores, A Lavanderia mostra como essas fraudes afetam a vida das pessoas comuns e como a adoção de mecanismos mínimos de integridade poderiam evitá-las”, avalia o sócio e coordenador do Núcleo de Direito Administrativo da Dotti Advogados, Francisco Zardo.
Breaking Bad
Breaking Bad é uma série americana de 2008, criada e produzida por Vince Gilligan. Ela retrata a vida do químico Walter White, um homem brilhante, mas frustrado em dar aulas para adolescentes do ensino médio enquanto lida com um filho que sofre os efeitos de uma paralisia cerebral, uma esposa grávida e dívidas intermináveis. White, então, é diagnosticado com um câncer no pulmão – o que o leva a sofrer um colapso emocional e abraçar uma vida de crimes para pagar suas dívidas hospitalares e dar uma boa vida aos seus filhos.
Walter resolve produzir metanfetamina de alta pureza e acaba virando um drug lord. Amplamente considerada uma das melhores séries da história, recebeu inúmeros prêmios, incluindo dezesseis Primetime Emmy Awards, oito Satellite Awards, duas premiações do Globo de Ouro e um Prêmio Escolha Popular. Em 2014, entrou para o Livro dos Recordes como o seriado mais bem avaliado de todos os tempos pela crítica. O termo “breaking bad” é uma gíria que significa: alguém desviou-se do caminho correto e passou a fazer coisas erradas. “É a minha série predileta dentre tudo que já assisti!”, assume Patrícia Godoy.
Client 9
Documentário de 2010 sobre o escândalo de Eliot Spitzer, uma estrela em ascensão dentro do Partido Democrata, conhecido como um político de bom senso e antigo procurador-geral, em 2008, que renuncia ao cargo de governador de Nova Iorque, com apenas um ano de mandato, devido ao seu envolvimento em um escândalo sexual. “Ele era o procurador que ficou conhecido como o “Xerife de Wall Street, e depois que já tinha sido eleito governador de Nova Iorque, caiu por um escândalo envolvendo uma rede de prostituição”, discorre Patricia Godoy.
Clube de Compras Dallas
Vencedor de dois prêmios na edição de 2014 do Globo de Ouro – melhor ator para Matthew McConaughey e melhor ator coadjuvante para Jared Leto – o drama Clube de Compras Dallas (Dallas Buyers Club) retrata a luta de um boiadeiro do Texas que vê a sua vida descontraída, virada do avesso quando é diagnosticado com AIDS e lhe dão 30 dias de vida.
Determinado a sobreviver, ele decide agir pelas suas próprias mãos, rastreando tratamentos alternativos em todo o mundo por meios legais e ilegais. “O filme trata de um caso polêmico e verídico ocorrido nos Estados Unidos em que houve ausência de integridade na conduta de grandes empresas farmacêuticas e órgãos de controle estatal na regulamentação, fiscalização e punição de um cidadão que importava ilegalmente medicamentos contra o HIV. Uma bela lição sobre a exigência do compliance em todos os setores da sociedade”, considera o professor do mestrado em Direito da Universidade Positivo, Fernando Mânica.
Dirty Money – Na Rota do Dinheiro Sujo
É um documentário americano em formato de minissérie que aborda os grandes escândalos de corrupção corporativa nos Estados Unidos. São tratados, por exemplo, o caso de fraude no dispositivo catalisador de veículos a diesel da Volkswagen, e a ligação do HSBC com lavagem de dinheiro do tráfico de drogas, no México. É uma obra original da Netflix, que lançou todos os 6 episódios de uma vez, em 2018. Os produtores executivos da minissérie incluem o documentarista Alex Gibney, já premiado com o Oscar.
Cada episódio se concentra em um exemplo de corrupção corporativa e inclui entrevistas com os principais participantes de cada história. “A série traz um importante panorama das formas pelas quais a falta de mecanismos de integridade efetivos favorece práticas que prejudicam toda a coletividade”, comenta a superintendente jurídica da Tecnobank, Luciana Sterzo. Segundo ela, Dirty Money mostra do que o capitalismo é capaz quando seus limites não ficam claros. Empresas fazem bilhões enquanto a população perde, muitas vezes, sem nem mesmo saber, e acabam virando apenas peças que geram lucro.
Enron: Os mais espertos da sala
É um documentário americano de 2005, escrito e dirigido por Alex Gibney e baseado no livro de Bethany McLean e Peter Elkind. Apresenta a ascensão e queda da corporação do ramo de energia e gás natural Enron, a sétima maior empresa dos Estados Unidos, envolvida em um esquema mascarado por uma fraude contábil. A falência da empresa de energia foi decretada em 2001 e deixou saldo de 20 mil desempregados e um bilhão de dólares na conta dos responsáveis pela fraude.
As filmagens consultam analistas econômicos e ex-empregados, que denunciam Kenny Lay e Jeff Skilling como os cabeças do escândalo. O filme mostra também o envolvimento da empresa com a crise energética da Califórnia, decorrente da desregulamentação do sistema elétrico. “Esse documentário relata como surgiu a Lei SOX, depois dos escândalos em companhias de energia elétrica nos EUA. A empresa Arthur Andersen, na época, uma das maiores companhias globais de auditoria, também foi atingida. O enredo, baseado em fatos reais, retrata a importância da governança no mundo corporativo”, ressalta a superintendente jurídica da Tecnobank, Luciana Sterzo.
Inside Job
A diretora de Ética e Compliance e acadêmica da Academia Nacional de Seguros e Previdência (ANSP), Patricia Godoy, indica ainda o Inside Job (Trabalho Interno), mais um filme que retrata os lados obscuros de Wall Street, conduzido pelo diretor Charles Ferguson. Narrado por Matt Damon e indicado ao Oscar como melhor documentário, ele revela verdades incômodas da pior crise já vista desde 1929.
Baseado em uma extensa pesquisa e séries de entrevistas com políticos, economistas e jornalistas, o longa mostra as corrosivas relações de governantes, agentes reguladores e a Academia – e expõe também uma teia de mentiras e condutas criminosas que prejudicaram seriamente a vida de milhões de pessoas, principalmente por conta de cobiça, cinismo e farsas. Os causadores de tudo isso permanecem dando as cartas na mesa.
Ozark
É uma série de televisão americana de drama e suspense criada por Bill Dubuque, produzida pela Media Rights Capital e lançada em 2017 na Netflix. A série é estrelada por Jason Bateman, que interpreta um planejador de finanças, e Laura Linney, que faz a sua esposa, uma dona de casa que se transforma em agente imobiliária. O personagem principal desloca a família de um subúrbio de Chicago para uma comunidade de resort de verão situada nos montes Ozark, Missouri.
Após um esquema de lavagem de dinheiro fracassar, ele acaba ficando em dívida com um traficante de drogas mexicano. Indicada para 18 Emmys em 2020 e levando o prêmio de melhor atriz coadjuvante em série dramática para Julia Gardner, a produção tem 20 episódios divididos em quatro temporadas. “Usei essa série várias vezes em treinamentos de combate à lavagem de dinheiro”, conta a diretora de Ética e Compliance e acadêmica da Academia Nacional de Seguros e Previdência (ANSP), Patricia Godoy.
The Corporation
É um documentário canadense de 2003, dirigido e produzido por Mark Achbar e Jennifer Abbott, baseado em roteiro adaptado por Joel Bakan do livro “The Corporation: The Pathological Pursuit of Profit and Power” (A Corporação: a busca patológica por lucro e poder). O filme descreve o surgimento das grandes corporações como pessoas jurídicas, e discute, do ponto de vista psicológico, que, em sendo pessoas, que tipo de pessoas elas seriam.
O documentário ganhou 26 prêmios, e até bons comentários do lado conservador, como da revista The Economist, que o chamou de “um ataque surpreendentemente racional e coerente à instituição mais importante do capitalismo”. “A obra é fundamental para que se tenha a real dimensão da magnitude dos riscos sociais que as grandes empresas adquiririam o potencial de gerar nas últimas décadas. Para quem trabalha com programas de prevenção de ilícitos em empresas, deve-se ter como premissa conhecer profundamente o contexto em que está inserido”, afirma o coordenador do Núcleo Criminal na Dotti Advogados, Gustavo Scandelari.