O grande “boom” da internet ocorreu no início da década de 1990, com a padronização das indústrias de hardwares e softwares que passaram a utilizar o protocolo TCP/IP para troca de informações na WEB. Essa padronização permitiu a criação de milhares de endereços padrão como IPV4, IPV6, entre outras, e possibilitou o crescimento exponencial da rede mundial de computadores que conhecemos hoje.
É aqui que o conceito da neutralidade é questionado pelos respectivos segmentos das indústrias que hoje compõem o ecossistema da internet. Se antes as empresas com interesse na internet se resumiam a fabricantes de hardwares, softwares e operadoras de telefonia, hoje, além destas, existem várias outras empresas que nasceram durante a evolução da internet, como é o caso da Google, Netflix, Facebook, Yahoo, entre outras, e, ainda toda a cadeia de provedores de conteúdos multimídia, jornais, revistas, TVs e gravadoras.
Mas, afinal de contas, o que é essa tal de neutralidade? A neutralidade é o princípio fundamental da internet que confere igualdade de prioridade no transporte de pacotes (informações) na rede. Essa igualdade, que antes existia porque o ecossistema estava organizado para transportar pequenas quantidades de informações, hoje evoluiu. As operadoras, que perdem cada vez mais receita para aplicativos que são capazes de transmitir voz e dados a baixíssimo custo, querem rever as regras de cobrança para adequar a nova realidade a seus custos.
O assunto tem sido motivo de lutas judiciais nos EUA, sendo que em 2017 o FCC – Federal Communications Commission, órgão similar a Anatel no Brasil, decidiu que as operadoras poderiam cobrar por tipo de conteúdo, desde que o consumidor fosse devidamente informado. O Brasil, ao publicar a Lei 12.965/14, definiu a neutralidade como princípio basilar, definindo normas de proteção à privacidade, responsabilidade por publicação de conteúdos e deveres das operadoras de telefonia, no sentido de guardar registro de acessos dos usuários por seis meses e proibindo expressamente que a transmissão de conteúdos fosse feita por tipo de mídia que fizesse distinção entre pacotes de vídeo, músicas, e-mails, etc.
Se, por um lado, o acesso à informação é um bem fundamental ao ser humano, posto que vivemos na Sociedade da Informação, por outro, as operadoras necessitam de investimentos para manter o sistema com o mínimo de qualidade. A neutralidade, nesse sentido, tem produzido uma situação paradoxal na qual um bilhete de primeira classe está custando o mesmo preço de um bilhete da classe econômica. Essa disparidade ocorre porque tecnicamente o transporte de um pacote de vídeo é muito mais oneroso que o transporte de um pacote de texto.
Assim como temos que repensar nossa relação com a água, eletricidade e outros recursos, também temos que pensar a nossa relação com a internet, que em grande parte necessita de um recurso escasso, finito e não renovável: o espectro radioelétrico. A discussão se faz ainda mais necessária tendo em vista que a internet está presente em três a cada quatro domicílios no país. Segundo a PNAD Contínua TIC 2017, de 2016 para 2017, o percentual de utilização da Internet nos domicílios subiu de 69,3% para 74,9%. Outro dado importante é que o percentual de pessoas de 10 anos ou mais que acessou à Internet através do celular aumentou de 94,6% para 97,0%, também nesse período, e a parcela que usou a televisão para esse fim subiu de 11,3% para 16,3%. Essa tecnologia foi responsável por democratizar o acesso à informação nas últimas décadas, sendo uma importante ferramenta de promoção social e educacional.
por Dane Avanzi, empresário do setor de telecomunicações, advogado e diretor comercial no Grupo Avanzi