Dividendos são quase unanimidade entre os investidores brasileiros. Quando há dúvidas sobre qual ativo escolher, os dividendos sempre aparecem nos critérios de desempate. E a estratégia até certo ponto faz sentido, afinal, só pagam dividendos empresas que sejam minimamente lucrativas. Mas o que existe por trás deste cenário que cria uma fonte de retorno adicional?
Para o analista Felipe Silveira, da Capital Research, a primeira ressalva sobre dividendos deve ser feita exatamente sobre isso: “O dividendo não é uma fonte de retorno adicional. Ele é simplesmente a distribuição dos resultados da companhia que já pertencem aos acionistas e, dessa forma, devem ser refletidos pelo valor de mercado das empresas. É um dinheiro que já é seu e que você pode acessar vendendo alguns papéis da empresa, por exemplo”.
Mental accouting
Em um relatório publicado recentemente, Silveira analisou os riscos e vantagens de se priorizar investimentos em empresas que pagam dividendos, principalmente para aqueles que optam por alocar toda a carteira neste tipo de ativo. A modalidade cresceu consideravelmente no Brasil, muito por conta do chamado mental accouting, a contabilidade mental, que nada mais é do que a ilusão de se estar levando vantagem ou ganhando algo – neste caso, o bônus são os dividendos.
De acordo com esta teoria, investidores tendem a avaliar de forma diferente as empresas que pagam dividendo, justamente por acreditar que elas são mais vantajosas que as demais: o que, em muitos casos, é uma inverdade. “O preço das ações de empresas boas pagadoras de dividendos são negociadas a um prêmio em relação àquelas que não pagam, especialmente em períodos em que a taxa livre de risco está em um patamar muito baixo, como o atual, o que resultaria em um retorno esperado menor e um risco maior”, explica o analista.
Para Silveira, o foco do investidor deve estar no retorno total da carteira, independentemente da fonte. E, neste ponto, os dividendos ascendem mais um sinal de alerta, caso o plano de tributá-los, apresentado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, seja de fato implementado: “os acionistas terão mais um motivo para preferir vender as ações de uma empresa ao invés de receber dividendos dela, considerando que a isenção para vendas de até R$ 20 mil dentro do mês continue”.
A título de análise e comparação, Silveira apresentou no relatório alguns possíveis cenários com dados sobre o ROE (return on equity) de empresas. Quanto menor o ROE marginal – quanto de lucro é gerado para cada real investido pelos acionistas, mais interessante é o pagamento de dividendos. E quanto menor o múltiplo conhecido como price to book (preço da ação dividido por seu “valor de livro”), também melhor para quem aposta em ações que pagam bons dividendos. As análises completas estão disponíveis aqui.
Com base nos números, Felipe Silveira é enfático ao afirmar que “é muito difícil encontrar alguma empresa que esteja entregando bons resultados, com perspectivas positivas e que seja negociada abaixo do valor do seu PL, como é importante para essa estratégia de dividendos dar certo”.
Os motivos para essa ponderação são diversos: a redução das taxas de juros, uma forte valorização dos ativos e, consequentemente, uma penalização para quem busca aumentar o retorno reinvestindo em dividendos.
Outro fator relevante para as empresas que pagam bons dividendos diz respeito às barreiras de entradas dos setores de atuação que, segundo Silveira, foram destroçadas nos últimos anos. Com o avanço da tecnologia e a queda do custo de capital, muitas novas empresas puderam se inserir no mercado, alterando-os irreversivelmente.
O aspecto regulatório foi um dos que impactou fortemente o panorama competitivo, como no caso da queda de acordos de exclusividades de maquininhas e bandeiras de cartões: “O resultado é que hoje você pode receber pagamento de qualquer bandeira em praticamente todas as maquininhas disponíveis. E são várias. A Cielo é uma ótima pagadora de dividendos. Mas, o mercado tem penalizado as suas ações por conta da perspectiva negativa para o resultado da companhia e para os dividendos no futuro”, aponta o analista.
Dividend yield x dividend yield projetado
Para Silveira, no caso dos dividendos, é importante analisar as perspectivas e projeções das empresas, a fim de evitar que a carteira de investimentos fique vulnerável a médio e longo prazo: “Não importa o dividend yield atual da companhia, mas sim o dividend yield projetado. E não há nenhuma garantia de que uma boa pagadora de dividendos hoje continuará sendo no longo prazo. Os riscos para que não sejam nunca foram tão grande”.
Diante do cenário, ao analisar os riscos de se alocar um grande volume de investimentos em dividendos, o analisa considera que existem outras opções com mais potencial e retorno no momento, como as ações de crescimento, as growth stocks: “Atualmente, elas devem ter um peso maior na carteira em relação às ações que pagam altos dividend yields. Esse não é um panorama que deve continuar para sempre. O que pode acontecer ao termos um peso maior em empresas de crescimento é que a gente se antecipe e compre as empresas maduras e boas pagadoras de dividendos do futuro”.