O déficit habitacional é um dos grandes problemas que o Brasil enfrenta nas últimas décadas. Segundo dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), esse número chega atualmente a quase oito milhões de moradias. De acordo com levantamentos feitos pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) e pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), o déficit total recuou cerca de 330 mil unidades entre 2018 e 2019, mas mesmo assim o volume continua expressivo, o que aponta que ainda existem muitas famílias brasileiras vivendo sem condições habitacionais minimamente adequadas.
Ao longo dos anos, várias iniciativas governamentais foram colocadas em prática para facilitar o acesso à moradia, como o programa Minha Casa Minha Vida, que surgiu em 2009, contudo não se provou eficaz na promoção de redução efetiva do déficit habitacional. Esse cenário representa oportunidades valiosas para o setor da construção civil, que encontra nos chamados Fundos de Investimento Imobiliário (FII’s) um importante aliado para incrementar os negócios e, por consequência, contribuir para reduzir esse quadro no país.
Pedro Ernesto Bragança, sócio da TG Core, gestora de recursos independente com foco no mercado imobiliário, aponta que os FIIs que atuam no segmento residencial cresceram significativamente nos últimos anos. Um bom exemplo deste crescimento é a própria carteira do maior fundo da gestora, o TG Ativo Real, que é focada nesse segmento e apresentou crescimento de mais de 700% do seu Patrimônio Líquido (PL) nos últimos 2 anos. “Atualmente, aproximadamente 65% do fundo está alocado em empreendimentos voltados para o segmento residencial e pretendemos aumentar essa participação”. Esse crescimento, acentuado principalmente nos últimos três anos, pode ser verificado na participação dos Fundos de Investimento Imobiliário Residenciais na B3.Em 2016 eram negociados na bolsa apenas 10 fundos desse segmento e a soma de seus Patrimônios Líquidos (PL) era de aproximadamente R$1,0 bilhão. Atualmente, há mais de 20 fundos focados nesse segmento e o PL somado supera os R$ 2,5 bilhões.
E como os FII’s podem ser importantes aliados dos incorporadores regionais? Pedro responde essa pergunta apontando algumas alternativas propostas por essa modalidade de investimento: por meio de operações de crédito, como os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI), ou via parcerias com o médio empreendedor regional através das operações de Equity. “No primeiro caso, é uma operação de crédito privado com lastro em recebíveis imobiliário, ou seja, o fundo está no risco de crédito da operação. Já no segundo, o fundo constitui sociedade com o empreendedor, realiza os aportes necessários para desenvolvimento do projeto e corre os riscos do negócio juntamente com o sócio incorporador – é uma relação de sociedade entre as partes e não de credor e devedor”, explica.
Futuro
Para a TG Core, o crescimento dos FII’s voltados para o setor residencial é visto de forma positiva nos próximos anos. Tanto que, segundo Pedro, a intenção é manter e até aumentar seu portfólio de fundos com foco direcionado para esse segmento. “O potencial desse produto é promissor para os próximos anos pois, além de se apresentar como uma boa opção de investimento para nossos clientes, ele contribui para o crescimento e fortalecimento dos empreendedores regionais, no desenvolvimento do mercado imobiliário no interior do país e, consequentemente, na redução do déficit habitacional. Dessa forma, acreditamos que conseguimos fechar o círculo e agregar valor para as três pontas: o investidor, o parceiro empreendedor e o comprador de imóvel”, ressalta.
Em relação ao reaquecimento das vendas e retomada do mercado imobiliário em geral, o gestor também possui boas perspectivas para os próximos anos e destaca um dos principais fatores para isso: mínima histórica da taxa básica de juros. “O mercado imobiliário passou por um período de forte queda nas vendas de 2015 até 2018 devido as altas taxas de juros e medo do consumidor em assumir longos financiamentos em um momento de crise e desemprego em alta. Com a redução da taxa de juros ao patamar atual esse cenário mudou. Atualmente o consumidor consegue obter um financiamento habitacional de mesmo valor com exigência de renda e parcelas até 30% menor do que se teria 3 anos atrás com Selic próxima a 12% ao ano. Dessa forma a queda nos juros elevou consideravelmente o número de famílias elegíveis a tomar um financiamento imobiliário”. E completa, “outros fatores como a aprovação de reformas importantes para a agenda econômica, queda no preço dos imóveis ocasionada pela redução das vendas de 2015 a 2018 e a busca dos investidores por opções de investimentos mais rentáveis que a renda fixa também foram importantes para o reaquecimento do setor. Mesmo com a pandemia ainda em curso, as vendas apresentaram crescimento de forma significativa a partir de maio”.
E, com isso, o gestor enfatiza o potencial para que os FII’s assumam papel importante no fortalecimento dos empreendedores imobiliários regionais e na redução do déficit habitacional brasileiro. Segundo o estudo da Abrainc e FGV, para atender à demanda por habitação completamente, seria preciso construir, em média, 1,5 milhão de habitações por ano até 2030, já que o crescimento da população e a formação de novas famílias deve gerar uma demanda superior a 30,7 milhões de novos domicílios. “Os FII’s aparecem como peças importantes nesse cenário, pois só as ações do poder público provavelmente não serão suficientes para atender essa demanda”, conclui Pedro.